sexta-feira, 28 de junho de 2013

Ciúme

"Morre a luz, abafa os ares 
Horrendo, espesso negrume, 
Apenas surge do Averno 
A negra fúria Ciúme. 

Sobre um sólio cor da noite 
Jaz dos Infernos o Nurne, 
E a seus pés tragando brasas 
A negra fúria Ciúme. 

Crespas víboras penteia, 
Dos olhos dardeja lume, 
Respira veneno e peste 
A negra fúria Ciúme. 

Arrancando à Morte a fouce 
De buído, ervado gume, 
Vem retalhar corações 
A negra fúria Ciúme. 

Ao cruel sócio de Amor 
Escapar ninguém presume, 
Porque a tudo as garras lança 
A negra fúria Ciúme. 

Todos os males do Inferno 
Em si guarda, em si resume 
O mais horrível dos monstros, 
A negra fúria Ciúme. 

Amor inda é mais suave, 
Que das rosas o perfume, 
Mas envenena-lhe as graças 
A negra fúria Ciúme. 

Nas asas de Amor voamos 
Do prazer ao áureo cume, 
Porém de lá nos arroja 
A negra fúria Ciúme. 

Do férreo cálix da Morte 
Prova o funesto azedume 
Aquele a quem ferve n'alma 
A negra fúria Ciúme. 

Do escuro seio dos fados 
Saltam males em cardume: 
O pior é o que eu sofro, 
A negra fúria Ciúme. 

Dos imutáveis destinos 
Se lê no idoso volume 
Quantos estragos tem feito 
A negra fúria Ciúme. 

Amor inda brilha menos 
Do que sutil vagalume, 
Por entre as sombras que espalha 
A negra fúria Ciúme." 

A Negra Fúria Ciúme - Bocage, in Quadras)

Nenhum comentário:

Postar um comentário